
Games Magazine Brasil - Muito se fala da possibilidade de operação das loterias municipais. Você é um estudioso no assunto. Em que pé está essa situação?
Amilton Noble - Essa discussão foi provocada em função das ADPFs no Supremo Tribunal Federal (STF) há quase 5 anos. É uma discussão que, a meu ver, é tardia. Eu tive o prazer de moderar um durante o BiS SiGMA tratando exatamente sobre isso, as loterias municipais. O que eu entendo é que, independentemente se os municípios podem ou não operar suas loterias, precisamos superar isso e discutir qual é o papel dos municípios nas operações lotéricas no Brasil. O que eu entendo é que já está mais do que na hora da gente encontrar o papel dos municípios, sejam eles operando suas loterias ou sendo beneficiados diretamente pelas loterias. O que não pode é ficar uma discussão onde somente União e Estados se beneficiam dos recursos gerados pelas loterias. Na minha opinião, isso é injusto.
Temos de redesenhar o papel do município para que ele seja beneficiário, já que todos querem ter as suas loterias?
A origem da venda dos produtos físicos vem de dentro dos municípios. Os munícipes é que compram em algum lugar, e ao comprarem a sua loteria, seja ela estadual, seja ela federal, está gerando recursos para os outros entes federativos. É mais do que justo que se encontre uma parcela de contribuição aos municípios, seja ele operando suas próprias loterias e gerando recursos diretamente para a utilização nas causas sociais do seu interesse, ou recebendo rees oficialmente do que é arrecadado dentro do seu território.
Desde que não haja diminuição ainda maior do payout?
Esse é o grande desafio. O grande desafio é que não se pode seguir o modelo federal para isso, porque quem me acompanha sabe que eu sou um grande crítico ao modelo de operação das loterias Caixa. Gosto sempre de ressaltar que eu separo o corpo técnico do modelo. Eu sempre critico o modelo, que é exatamente o que você falou. ‘Está precisando de dinheiro, tira um pouquinho do apostador’. Isso vira um círculo vicioso e os produtos não crescem. Esse é um modelo que não deve ser seguido.
O Brasil tem o payout mais baixo do globo?
Se não for o mais baixo, é um dos mais baixos. Porque tem algumas variações em alguns países do mundo, mas é absolutamente impossível. Por mais nobre que sejam as causas, e elas são muito nobres, ninguém discute os rees que são feitos pelas loterias, mas a gente precisa entender que o que precisa aumentar é o volume. O bolo precisa crescer, porque o bolo crescendo, mesmo com fatias menores, o que se tem de recurso é muito maior em termos financeiros.
Gosto sempre de ressaltar o case de Massachusetts nos Estados Unidos, onde a loteria resolveu diminuir a sua participação para aumentar o payout para o apostador. Isso, nas loterias instantâneas, há muitos anos, e o volume de recursos foi multiplicado em seis vezes o que era arrecadado anteriormente. Esse modelo precisa ser seguido. O principal foco de uma operação lotérica é o apostador. Infelizmente não temos essa cultura no Brasil.
As apostas esportivas podem ser a saída para que os municípios e os estados aumentem suas receitas, já que a dinâmica da aposta esportiva permite um payout, uma devolução para o apostador, muito mais interessante do que as loterias tradicionais?
A loteria de aposta de cota fixa é um exemplo muito claro dessa diferença. O payout estabelecido em lei é de, no mínimo, 85%. Tem algumas operações que chegam a praticar RTPs da ordem de 96% a 97%.
São duas coisas absolutamente difíceis de se comparar: uma loteria tradicional pagando 43% de prêmio, como é a Mega-Sena, de um RTP de um Aviator ou de um Fortune Tiger, que paga 96% de retorno para o apostador. Isso mostra claramente que, mesmo se ganhando pouco, se gera um volume de turnover muito alto que acaba sustentando a operação. E isso, sim, é um modelo a ser seguido pelas loterias tradicionais, que precisam encontrar uma nova forma de chegar aos seus apostadores, porque senão vai ser difícil a renovação.
Há um problema de entendimento do apostador, já que ele vê um prêmio da Mega-Sena de R$ 40 milhões e acha que está ganhando um montão de dinheiro? O que representam esses 40 milhões dentro do bolo que é a arrecadação daquela extração se comprado com uma aposta de quota fixa?
O perfil da oferta é completamente diferente. A oferta de uma operação tipo Mega-Sena, que é a maior referência nacional em termos de loteria, é um produto para mudar de vida e isso acaba acontecendo com quem ganha. Por ser um produto cíclico, com três sorteios na semana, tem um perfil diferente do entretenimento das apostas esportivas. Isso mostra claramente – e eu gosto sempre de deixar como referência a Mega da Virada. A Mega da Virada vira uma comoção nacional. Todo mundo para o que está fazendo para fazer sua aposta, independentemente se ela se acha uma pessoa de sorte ou não, porque é o sonho.
Acho que no ano ado, se não me engano, foram de 600 milhões de reais. Se tivéssemos um payout adequado, teríamos uma Mega da Virada por mês, ao invés de uma por ano. Em vez de 600 milhões, alguns bilhões, como são as loterias nos Estados Unidos.
Com o crescimento das operações estaduais estamos rumando para um novo caminho?
Estamos rumando para o caminho da competição, da concorrência, onde se começa a contestar esta verdade, de que loteria precisa ser assim. Isso começa a ser contestado com os movimentos dos estados exatamente pela maior flexibilidade de operadores privados, que têm outro tipo de liberdade de atuação em seus negócios. Criticamos as operações no Brasil, mas não podemos nos esquecer que para lançar um produto lotérico é preciso ar um projeto de lei no Congresso Nacional. Isso é um absurdo. Isso engessa o setor.
Precisamos de liberdade para o operador e as loterias estaduais estão rumando para uma nova ordem no Brasil, especialmente se forem validadas as loterias municipais. Teremos três níveis de concorrência bastante acirrados, com operadores com autonomia de criar produtos com payouts mais atrativos.
Fonte: Exclusivo GMB